O Encanto dos Fósseis: Explorando a Conexão entre Arte, Paleontologia e Direito

Escrito em: 08 de novembro de 2024

Por: Thais Stany de Oliveira Linhares

Como uma velha árvore registra em seu tronco a memória de seu crescimento e de sua vida, assim também a Terra guarda a memória do seu passado.” Este é um trecho da Carta de Digne, elaborada no 1º Simpósio Internacional sobre a Proteção do Patrimônio Geológico, realizado entre os dias 11 e 13 de junho de 1991, na França. A citação ressalta que, antes da história humana, há uma vasta história natural da Terra a ser revelada e protegida. Seguindo essa linha de raciocínio, os registros fósseis representam um ponto de vista a partir do qual podemos enxergar o passado da Terra e, assim, o nosso próprio passado.

Ao longo do tempo, o significado de fóssil foi alterado diversas vezes. Entre os vários sentidos atribuídos a esse termo, temos hoje algumas definições básicas: (I) patrimônio histórico, sendo, portanto, equiparados a obras de arte construídas pelo ser humano; (II) objeto de estudo da paleontologia, servindo como instrumento para compreender a história e a evolução da vida na Terra; (III) bem ou riqueza geológica; e (IV) resíduo mineral sob um aspecto econômico (Abaide, 2009, p. 38-39). Assim, sua origem natural como bem de interesse da paleontologia não afasta os fósseis de seu valor cultural e histórico.

Unem-se, então, elementos fundamentais para a aproximação entre fósseis e arte: os museus. Sem esses espaços físicos — que, há milênios, se dedicam à preservação cultural — seria difícil reunir tanta riqueza de estudos na área da paleontologia. Seu surgimento e desenvolvimento ocorreram ao longo do tempo de forma singular. Em 1565, temos a primeira ilustração de uma coleção de objetos fósseis expostos em museus: a Arca de Johann Kentmann. Concluímos, até aqui, que arte e paleontologia compartilham uma origem comum na exposição e caracterização de objetos em museus, assim como ocorre com a história, a literatura e outras ciências.

Entrando no campo específico da arte — vista como mercadoria nas sociedades capitalistas —, ela carrega a ideia central de ser um produto originado a partir de agentes criadores que utilizam matérias ou ideias. A arte é protegida por direitos autorais, conforme previsto na Lei nº 9.610, de 1998. Com base nessa definição, percebemos que fósseis, a princípio, não seriam considerados objetos de arte, pois em sua formação não há, necessariamente, a participação humana ativa.

No entanto, fósseis podem se transformar em arte à medida que se tornam objetos de ação artística — seja por meio da formação de coleções, seja pela paleoarte (que reconstrói seres vivos do passado com base na interpretação dos fósseis), ou ainda por sua influência no cinema, como é o caso da famosa trilogia Jurassic Park, dirigida por Steven Spielberg.

Por fim, percebemos que a paleontologia alimenta a arte — nos museus e nos ambientes cinematográficos —, e que a arte também inspira a paleontologia, como no exemplo do fóssil Australopithecus mais famoso da história, Lucy, com cerca de três milhões de anos, que recebeu esse nome em homenagem à música dos Beatles “Lucy in the Sky with Diamonds”. Observa-se, assim, uma fronteira que se funde entre arte e paleontologia ao longo da história da Terra. Ambas são consideradas expressões culturais e seguem protegidas pela Constituição Federal de 1988.

Dessa forma, ainda que fósseis possam dialogar com a arte em diversos contextos culturais e científicos, é fundamental compreender que, no Brasil, esses vestígios do passado são bens públicos, protegidos legalmente como patrimônio da União. Sua importância ultrapassa o campo estético ou comercial, ocupando um lugar central na preservação da memória natural e histórica da Terra.

Texto fonte: Vasconcelos, F. T. (2022). Os fósseis como obras de arte: transversalidade entre direito, paleontologia e arte. Aya Editora. O Direito nas intersecções entre o fático e o normativo. Volume II. p 270-277. DOI: 10.47573/aya.5379.2.60.19.

Disponível em: Disponível em: https://ayaeditora.com.br/wp-content/uploads/2022/02/L119.pdf. Acesso em: 11/05/2025.

Fonte e legenda da imagem de capa: Close do crânio do Malawisaurus em exibição no Royal Ontario Museu.

Disponível em: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:August_1,_2012_-_Close-up_of_Malawisaurus_Skull_on_Display_at_the_Royal_Ontario_Museum.jpg#/media/File:August_1,_2012_-_Close-up_of_Malawisaurus_Skull_on_Display_at_the_Royal_Ontario_Museum.jpg. Acesso em: 11/05/2025.

Texto revisado por: Giulia Alves e Alexandre Liparini.

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