Microrganismos no permafrost: fósseis ou vivos?

Escrito em: 07 de dezembro de 2024

Por: Ana Clara Moura e Souza

Uma grande questão que se discute atualmente é o efeito do aquecimento global no ressurgimento de microrganismos que estavam retidos em ambientes congelados. O permafrost é um solo caracterizado por permanecer congelado por pelo menos dois anos consecutivos e por ser um reservatório de carbono orgânico antigo. Com o degelo, os microrganismos ali presentes podem degradar a matéria orgânica que antes estava presa, levando à liberação de gases do efeito estufa, como metano e gás carbônico. Mas afinal, esses organismos estão vivos ou não? 

Por meio da análise dos danos no DNA é possível saber quais estão vivos ou foram fossilizados, pois se estabelece que aqueles que sofreram mais danos pertencem a microrganismos fósseis, uma vez que células ativas mantêm o reparo do DNA. Em temperaturas muito baixas a preservação de material genético é excepcional. No entanto, tanto o DNA extracelular (eDNA) quanto o intracelular (iDNA) ainda podem sofrer danos ao longo do tempo. 

Outra análise foi a razão entre enantiômeros de aminoácidos encontrados nas amostras, que são moléculas com a mesma fórmula molecular, mas que não se sobrepõem; como nossas mãos, que são iguais, mas se você colocar uma sobre a outra os dedos correspondentes não se tocam. Eles são divididos em levogiros e dextrogiros, que para entendermos melhor podemos comparar às mãos esquerda e direita, por exemplo. Sabe-se que os seres vivos utilizam aminoácidos levogiros, então se houver levogiros se tornando dextrogiros, maior a quantidade de fósseis naquela amostra e menos microrganismos vivos.

Na região de coleta na Sibéria, o permafrost tem uma característica curiosa. Há milhares de anos, ocorreu uma transgressão e regressão do mar que formaram um horizonte marinho no Pleistoceno Médio (780 a 130 mil anos) e, por isso, foram coletados 22m desse solo e usadas amostras de profundidades diferentes (3,4m; 5,8m e 14,8m) para se entender a transição entre os paleoambientes marinho e terrestre  que ocasionaram mudanças nos ecossistemas.

Muitos microrganismos podem ter se adaptado às diferentes condições e permanecido ativos e outros podem ter sido extintos e fossilizados. Nas duas  camadas mais profundas, o DNA estava mais danificado e fragmentado em pedaços curtos. A razão entre dextrogiros e levogiros também aumentou com a profundidade, sugerindo uma maior quantidade de dextrogiros. 

Sendo assim, pode-se dizer que, sim, muitos deles ainda estão vivos! Quanto maior a profundidade, maior a quantidade de fósseis, mas ainda podem ser encontrados microrganismos vivos em todas elas. Isso porque alguns ainda apresentavam danos mínimos ao material genético, além de ainda serem encontrados aminoácidos levogiros mesmo que em menor quantidade, nas maiores profundidades.

 Essa pesquisa revela uma nova estratégia para se estudar DNA preservado em ambientes antigos como cavernas, sedimentos de águas profundas e, sobretudo, ambientes congelados. Por meio da comparação dos danos ao DNA antes e após o reparo é possível discriminar vida extraterrestre passada e viva que estão presentes nas diferentes camadas do permafrost de Marte, além de possibilitar a identificação de microrganismos vivos que podem metabolizar compostos orgânicos do solo no contexto do aquecimento global, interferindo no ciclo do carbono.


Palavras-chave: Microrganismos, permafrost, fósseis, DNA

Fonte e legenda da imagem de capa: Solo permafrost fragmentado com as camadas evidenciadas Benjamin Jones/USGS, retirado de Wikimedia Commons. Disponível em: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Collapsed_permafrost_(9356).jpg

Espécime de Nautilus vanuatuensis. Disponível em: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Nautilus_vanuatuensis.jpg

Texto fonte: LIANG, Renxing et al. (2021). Genomic reconstruction of fossil and living microorganisms in ancient Siberian permafrost. Microbiome, v. 9, n. 110. Doi: 10.1186/s40168-021-01057-2.

Disponível em: https://microbiomejournal.biomedcentral.com/articles/10.1186/s40168-021-01057-2. Acesso em: 4 de dez. de 2024.

Texto revisado por: Giulia Alves

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