Megafauna para além de mamíferos: conheça a rã-gigante do Eoceno!

Escrito em: 21 de abril de 2023

Por: Laura Romanelli

Que estamos cercados de animais gigantes você já sabe, afinal, dividimos o mesmo planeta com elefantes, girafas, baleias etc . Entretanto, você já parou para pensar no maior sapo (Anura) do mundo?

Em Janeiro de 2008, um grupo de cientistas liderados pelo Dr. Rodrigo Otera encontrou um fragmento de osso pertencente a anfíbios que habitaram a Terra no Eoceno, época geológica que ocorreu há cerca de 40 milhões de anos atrás. O achado por si só já é bem importante, já que são poucos os registros desse grupo de animais neste período, mas o seu tamanho logo chamou a atenção dos pesquisadores. 

O fragmento em questão se trata de um osso do braço conhecido como úmero, hipótese que só foi possível de ser elaborada porque estes animais apresentam morfologia desse osso bem conservada com seus antecessores e sucessores. Dessa forma, os cientistas compararam todas as características do úmero encontrado com outros úmeros fósseis mais recentes. Além disso, a análise comparativa se estendeu para animais vivos nos dias de hoje, já que a macro-região em que ele foi encontrado é habitada por uma espécie muito especial conhecida como rã-capacete (Calyptocephalella gayi).

A rã-capacete é endêmica da região temperada centro-sul do Chile, além de ser a única espécie viva desse gênero no mundo. Por isso, ela é considerada uma relíquia de uma linhagem com várias espécies extintas que temos registros a partir do Cretáceo (135 milhões de anos atrás). Os resultados das análises de comparação apontaram que o úmero fóssil partilhava diversas características em comum com o úmero da Calyptocephalella gayi, e com o úmero de linhagens intermediárias que separam esses dois animais. Além disso, ele se diferenciava do úmero de outras duas famílias de anuros comuns na região: Leptodactylidae e Pipidae. Com essas informações, os pesquisadores perceberam que o fóssil em questão tem muito potencial para pertencer ao gênero Calyptocephalella.

E não para por aí, por meio de cálculos matemáticos, que nos permite simular o plano corporal de animais extintos a partir dos seus fragmentos, os cientistas chegaram à hipótese que o úmero encontrado teria em média 12,5cm. O que permitiria esse animal alcançar quase 60 cm de comprimento!

Para se ter uma ideia de comparação, a rã-capacete atual alcança apenas metade desse tamanho. Já a rã-golias (Conraua goliath), considerada um dos maiores anfíbios do mundo, chega até 40 cm, e pode pesar cerca de 3 kg. Esses números colocam essa espécie ancestral ao lado de Beelzebufo ampinga (sapo-de-chifre-gigante), um outro anfíbio pré-histórico que ocorreu nas proximidades da Ilha de Madagascar, conhecido por ser capaz de se alimentar de filhotes de dinossauros!

Além de análises taxonômicas e estatísticas sobre formas e números, a evidência de um animal sensível ao meio ambiente, no extremo sul-chileno, nos ajuda a desenhar vagamente o passado climático desta região. O fóssil foi encontrado no mesmo estrato geológico que outros restos de animais marinhos, como dentes do extinto tubarão-tigre (Striatolamia macrota) e fragmentos de um pinguim gigante do gênero Palaaeudyptesn (táxon extinto que alcançaria até 1,5 m de comprimento). O que revela um ambiente costeiro próximo a Bacia de Magalhães, que hoje é parcialmente coberto por gelo, ameno o suficiente para habitar anuros gigantes.

Por isso, o fragmento desse úmero ainda nos guarda diversas respostas sobre linhagens de anuros no início do Cenozoico. Enquanto não conseguimos revisitar todo o passado podemos garantir nossa observação do futuro com ações de preservação, uma vez que a rã-capacete é considerada uma espécie vulnerável à extinção pela Lista Internacional de Espécies Ameaçadas (IUCN/2023). Esse “fóssil-vivo” ainda será de extrema importância se quisermos compreender um pouco mais sobre a paleoecologia dessa região. 

Texto fonte: Otero, R. A., et al. Evidence of a giant helmeted frog (Australobatrachia, Calyptocephalellidae) from Eocene levels of the Magallanes Basin, southernmost Chile. Journal of South American Earth Sciences, 2014. v. 55, p.133-140. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.jsames.2014.06.010. Acesso: 18/04/2023.


Disponivel em: https://www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S0277379120305722#!

Fonte e legenda da imagem de capa: Gráfico ilustrativo que compara o tamanho de um exemplar vivo da rã-capacete (Calyptocephalella gayi) com o ancestral antigo identificado a partir do fragmento de úmero encontrado.

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Texto revisado por: Leticia de Souza Lopes e Alexandre liparini

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