Como a armadura de dinossauros servia para além de proteção?

09 de Abril de 2023

Por: João Pedro Passos

Dinossauros são figuras muito presentes na cultura pop, principalmente pelas franquias Jurassic Park e Jurassic World. Você certamente já se deparou com alguma ilustração de dinos na vida, ou até mesmo com brinquedos que as crianças adoram, ainda que não soubesse exatamente de que tipo de animal se tratava. A diversidade de formas entre os dinossauros, especialmente os extintos, é imensa, e esse é provavelmente o principal motivo pelo sucesso desses seres na mídia.

Dentre todos os dinossauros, desde os grandes carnívoros que conhecemos (e.g. tiranossauros) e os queridos herbívoros pescoçudos (i.e. saurópodes), existe um grupo que se distingue dos demais por uma característica peculiar a presença de uma carapaça rígida em suas costas. Este é o grupo dos anquilossauros (nome que significa “réptil imóvel”, ou com pouca locomoção, em grego), dinossauros quadrúpedes e herbívoros que tinham o dorso recoberto por osteodermas uma série de escamas rígidas compostas por osso que funcionavam como uma espécie de armadura óssea para estes animais. Mas será que essa armadura desempenhava apenas função protetiva?

Através do Programa Antártico Brasileiro (PROANTAR), que realiza expedições científicas no continente gélido, foram encontrados fósseis de Antarctopelta, um Gênero de anquilossauro que habitou a Antártida há milhões de anos, quando essas terras ainda não eram completamente congeladas. Graças a estes restos bem preservados, um grupo de pesquisadores brasileiros, em associação com a Universidade de Cambridge, foi capaz de realizar uma análise dos osteodermas pertencentes ao Gênero, o que revelou novidades sobre estes animais encouraçados.

A partir de análises de raio-x realizadas nesses fósseis, foi possível compreender melhor a estrutura e a composição das escamas que defendiam esses tanques de guerra vivos, e também notar diferenças entre os osteodermas de diferentes espécies. Assim, os pesquisadores perceberam que as escamas do anquilossauro encontrado na Antártida, em comparação com as de fósseis de nodossauros (parentes muito próximos dos anquilossauros, que viveram na América do Norte), possuíam menor massa óssea e mais tecido mole (como carne e nervos) rico em vasos sanguíneos. Em síntese, as escamas destes anquilossauros se comunicavam melhor com o restante do corpo, enquanto as dos nodossauros eram mais rígidas e resistentes. Esta melhor comunicação, de acordo com a hipótese dos cientistas, possibilitava o armazenamento de nutrientes em suas escamas ósseas nutrientes esses que poderiam ser retirados das escamas em momentos de necessidade. Esta é uma característica semelhante às corcovas de camelos, que armazenam nutrientes e água no deserto seco.

Essa função adicional teria sido crucial para a dispersão destes animais ao longo do globo, dando-os a oportunidade de se adaptarem a ambientes mais hostis e com poucos recursos. E, para além destas funções defensivas e de controle de nutrientes no corpo, os pesquisadores também sugeriram outras utilidades para estas estruturas, como a regulação da temperatura corporal e atração de parceiros sexuais. Assim, com estes estudos, torna-se viável repensar inclusive sobre as funções que escamas desempenham em animais extantes, como jacarés, crocodilos e dragões-de-komodo.

Texto Fonte: Brum, A., Eleutério, L., Simões, T., Whitney, M., Souza, G., Sayão, J., & Kellner, A. (2023). Ankylosaurian body armor function and evolution with insights from osteohistology and morphometrics of new specimens from the Late Cretaceous of Antarctica. Paleobiology, 1-22.

DOI: https://doi.org/10.1017/pab.2023.4

Disponível em: https://www.cambridge.org/core/journals/paleobiology/article/abs/ankylosaurian-body-armor-function-and-evolution-with-insights-from-osteohistology-and-morphometrics-of-new-specimens-from-the-late-cretaceous-of-antarctica/DC06EE5FA73B7264716D62A8B0B5B9DB

Fonte e legenda da imagem de capa: Ilustração de um Ziapelta, dinossauro pertencente à Família dos anquilossauros. Acesso em: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Ziapelta_transparent.png


Texto revisado por: Gustavo Firpe e Alexandre Liparini

Publicado por Gustavo Firpe

Biólogo e Professor. > ~° Mestrando em Zoologia pela UFMG. > Pesquisador na área de Paleontologia e Macroevolução. > §

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