Escrito em 06 de abril de 2023
Por: Júlia Gomes de Carvalho
Os estudos sobre a coloração dos dinossauros têm ganhado destaque e despertado bastante interesse na população, afinal, são poucos os que podem afirmar saber o padrão de coloração de um deles. Essa área, além de ser muito importante para a própria caracterização desses gigantes pré-históricos, também pode ser muito útil para desvendar outros aspectos da vida desses organismos.
No caso do artigo ‘Camuflagem 3D no dinossauro Ornithischia’ publicado em 2016 pela revista Current Biology, os pesquisadores demonstram como a pigmentação pode nos informar sobre o habitat em que o animal teria vivido.
Primeiramente, é interessante entender como podemos distinguir qualquer tipo de padrão desses restos mortais tão antigos e, aparentemente, indecifráveis. Por meio de fotografias e obtenção de imagens adequadas, é possível identificar resíduos orgânicos ainda preservados, que são a peça chave dessa caracterização! Com a ajuda dessas técnicas, os pesquisadores observam o formato de estruturas, como os melanossomos (parecidos com os que nós temos para armazenar melanina na pele), e conseguem inferir a possível coloração do fóssil estudado.
Mas e o habitat, onde entra nessa relação? Podemos fazer um paralelo com animais modernos que conhecemos e que vivem no meio selvagem, cujos mecanismos de camuflagem são muito importantes e geram uma grande vantagem adaptativa perante à pressão seletiva. Podemos ter o mesmo pensamento para os dinossauros: o seu padrão de coloração pode indicar se aquele organismo se camuflaria melhor em ambientes com iluminação direta (habitats abertos, como savanas), ou com iluminação difusa (habitats mais fechados, como sob copas de árvores).
Para verificar a hipótese, os pesquisadores fizeram um interessante experimento. Com os dados obtidos a partir da investigação de fóssil classificado como uma espécie de Psittacosaurus, fizeram um modelo 3D simulando seu padrão de coloração. Além disso, fizeram um modelo seguindo o mesmo formato do animal, mas com coloração uniformemente cinza e o expuseram a diferentes padrões de iluminação.
Com os padrões de cor e sombra obtidos, foi constatado que a intensidade e a gradação da coloração variam de acordo com a iluminação do ambiente em que o animal teria vivido. No caso de ambientes em que a iluminação é difusa, a gradação da coloração escura para a clara ocorre mais ventralmente no animal (região da ‘barriga’), ou seja, o animal é predominantemente escuro com apenas a região da barriga mais clara, e, no caso de ambientes com luz direta, a gradação ocorre mais lateralmente, ou seja, o animal possui a parte superior mais escura, mas a transição para a parte clara ocorre mais ‘rapidamente’, nos flancos.
Finalmente, compararam esses padrões obtidos com o modelo 3D colorido e, assim, conseguiram inferir que o animal estudado habitava locais com iluminação difusa, já que possuía essa gradação descrita como ventral.
Essa análise da ligação entre o contra-sombreamento e o habitat indica uma forma muito promissora de prever a ocupação do habitat por espécies extintas e talvez pouco conhecidas.
Texto fonte: Vinther, J; Nicholls, R; Lautenschlager, S; Pittman, M; Kaye, T; Rayfield, E; Mayr, G; Cuthill, I. (2016) 3D Camouflage in an Ornithischian Dinosaur. Current Biology, v. 26, n. 18, p. 2456-2562. DOI: 10.1016/j.cub.2016.06.065 Disponível em:<https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0960982216307060?via%3Dihub> Acesso em: 29/04/2024.
Fonte e legenda da imagem de capa: Modelo do dinossauro Psittacosaurus, com as cores baseadas na pigmentação da pele do espécime estudado no artigo. Figura 3 do artigo. Disponível em: <https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0960982216307060?via%3Dihub> Acesso em: 29/04/2024.
Texto revisado por: Luiza Leite e Alexandre Liparini