Que preguiça de extinção!

01 de outubro de 2022

Por: Eduardo Gutseit

Mudanças climáticas, poluição do ar e da água, extinção de espécies animais e vegetais… É bem claro para nós, hoje, que os seres humanos são responsáveis por grande parte das mudanças ambientais observáveis aos nossos olhos. Modificamos o mundo natural ao nosso redor para formar grandes sociedades, que exigem da Natureza uma quantidade enorme de recursos, e isso acaba levando à perda de habitats e nichos de outros indivíduos, que acabam entrando em processo de extinção.

Extinção é o desaparecimento definitivo de uma espécie de ser vivo. É um processo natural, e muito importante na história da evolução das espécies. Entretanto, com o crescimento e desenvolvimento da complexidade da população humana, vemos cada vez mais extinções devido a causas antrópicas do que a causas naturais. Nesse texto, vamos ver um dos primeiros casos em que os seres humanos foram responsáveis pela extinção de outros seres, as preguiças.

Esse grupo de animais, hoje visto como muito carismático, pelo tamanho e pela fofura, há milhares de anos eram gigantes que dominavam o cenário da megafauna do continente americano, principalmente na América do Sul. As preguiças pertencem ao grupo Xenarthra, e eram muito abundantes por aqui, até que a grande maioria de suas espécies foram extintas, deixando pouquíssimos descendentes, que são as pequenas preguiças que temos hoje.

No Holoceno, há cerca de 10.000 anos, o grupo das preguiças contava com 19 gêneros, dos quais algumas espécies apresentavam indivíduos terrestres com até 3.000 kg. Todavia, hoje temos cinco espécies de preguiças arbóreas, com até 8 kg. E os responsáveis por essa perda de biodiversidade de preguiças foram nós, humanos. Como Davi e Golias, os seres humanos foram responsáveis pelo desaparecimento das preguiças, que foram intensamente caçadas.

O trabalho desenvolvido por David W. Steadman e colaboradores demonstraram, através da técnica de datação de isótopo radioativo do carbono, que a idade dos fósseis mais recentes de preguiças corresponde com o período de ocupação humana do ambiente. A hipótese mais aceita da migração humana ao longo do globo propõe que os humanos chegaram nas Américas através do Estreito de Bering, que conecta a Rússia aos Estados Unidos. Dessa forma, os primeiros humanos colonizaram primeiro a América do Norte e depois a América do Sul.

Quando os cientistas acessaram os dados da idade dos fósseis das preguiças desses ambientes, constataram que o mais recente da América do Norte tinha 10.400 anos, e o da América do Sul 10.200 anos. Ou seja, primeiro os humanos extinguiram as preguiças norte-americanas, e, na medida em que migraram para o sul, extinguiram as que aqui viviam.

Entretanto, essa proximmidade no tempo entre as localidades continentais não se observa nas ilhas caribenhas. No Haiti, Cuba e outras ilhas, os fósseis mais recentes eram de 5.000 a 6.000 anos mais recentes que aqueles que foram encontrados no continente. E isso reafirma a hipótese de que os humanos são os responsáveis pela extinção das grandes preguiças, pois a ocupação humana dessas ilhas se deu de forma mais tardia que as áreas continentais.

Outras hipóteses postulavam que a extinção dessas preguiças se deu por meio de glaciações intensas ocorridas no período. Entretanto, a análise dos coprólitos (fezes fossilizadas) das preguiças demonstram que espécies vegetais da época, achadas nas fezes, tinham representantes atuais na região em que os fósseis foram achados. Ou seja, se realmente a glaciação fosse responsável pela extinção, espécies vegetais também teriam se extinguido. Outro contra argumento é a região predominantemente tropical em que as preguiças viviam, que dificultariam a extinção desses animais, devido a alteração climática menos intensa nessa região.

Texto fonte: Steadman DW, Martin PS, MacPhee RD, Jull AJ, McDonald HG, Woods CA, Iturralde-Vinent M, Hodgins GW. Asynchronous extinction of late Quaternary sloths on continents and islands. PNAS – Proceedings of the National Academy of Sciences of the United States of America. 2005 Aug 16; 102(33):11763-8. Doi: 10.1073/pnas.0502777102. Disponível em <https://www.pnas.org/doi/10.1073/pnas.0502777102>, acessado em 23/05/2023.

Fonte e legenda da imagem de capa: Modelo de preguiças fósseis de Cuba e dos EUA por Dallas Krentzel. Extraída de commons.wikimedia.org. Disponível em: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Ground_sloths.jpg (acessada em: 23/05/2023).

Publicado por Alexandre Liparini

Mineiro, gaúcho, sergipano, e por que não, alemão? No caminho sempre a paleontologia como paixão e agora como profissão. Adora dar aulas e pesquisar sobre origens e evolução. Se esse for o tema, podem perguntar, por que não?

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