19 de novembro de 2021
Por: Gustavo Caldeira Cotta
De acordo com os estudos evolutivos mais recentes, os Répteis e as Aves são mais próximos do que se imaginava. Não obstante, popularizou-se o dizer de que “galinhas são dinossauros reduzidos”. Isso não pode ser considerado como uma verdade, mas, reflete bem a proximidade entre esses grupos – o grupo das aves se originou de um ancestral que era dinossauro e tanto Dinossauros, quanto Aves, são componentes do grupo Archosauria, grande grupo que inclui também, por exemplo, os crocodilos atuais. Nesse contexto, pesquisadores notaram que um fóssil que havia sido associado às aves representa, na prática, um animal de um outro grupo relacionado aos répteis, os Lepidosauria.
A espécie em questão corresponde ao Oculudentavis khaunggraae, fóssil preservado em âmbar encontrado em Myanmar, país asiático que possui um amplo registro fóssil de diversos períodos. A princípio, as características cranianas e de algumas vértebras do fóssil apontavam para a inclusão desta espécie no grupo das aves: seus olhos eram grandes, o seu rostro era longo e delgado e o seu crânio possuía formato de cúpula. Mas ainda haviam dúvidas em pontos muito importantes para concluir a classificação deste espécime. A forma com que os dentes de Oculudentavis khaunggraae se dispõem no crânio também pouco remete ao padrão encontrado nos Archosauria, logo, haviam muitas incoerências morfológicas em sua classificação.
Após estudos mais aprofundados que envolveram o escaneamento e digitalização 3D deste fóssil e a posterior avaliação de suas características morfológicas, os pesquisadores notaram que algumas características eram muito incomuns para o padrão encontrado normalmente em aves, destacando que a forma dos ossículos que formam a cavidade que abriga os olhos, a órbita, era muito similar à forma encontrada em lagartos, répteis representantes do grupo Lepidosauria. Além disso, outras características dos ossos do crânio deste fóssil possibilitavam um movimento semelhante ao de outros lagartos, chamado de estreptostilia, e que consiste basicamente na articulação entre diversos pontos nos ossos do crânio, permitindo a redução do estresse físico no crânio, e melhorando a capacidade de manipulação do alimento, com o custo de limitar a força de mordida desses animais. Aves, por sua vez, também apresentam estreptostilia, mas com configurações morfológicas diferentes da encontrada nos lagartos.
Assim, após as análises de diferentes pesquisadores, a espécie Oculudentavis khaunggraae se mostrou mais relacionada ao grupo dos Squamata, que representa sobretudo os lagartos e as serpentes, que são considerados como componentes de Lepidosauria. Segundo os dados reconstruídos pelos pesquisadores, Oculudentavis khaunggraae era, portanto, um lagarto diurno com excelente acuidade visual e movimentos mandibulares rápidos que eram muito eficientes para capturar insetos! Bem diferente de um dinossauro ou uma ave, não é?
Artigo fonte: Krister T. Smith. 2021. Paleontology: It’s a bird, it’s a plane, it’s Oculudentavis! Cell Press Current Biology, v. 31, n. 15, R948–R971. DOI: 10.1016/j.cub.2021.06.017 <Clique aqui para acessar o artigo fonte>
Fonte e legenda da imagem de capa: Essa figura aponta os elementos cranianos de uma espécie do gênero Oculudentavis, revelando a sua semelhança com as estruturas cranianas de lagartos. O crânio tem aproximadamente 1,5 cm de comprimento. Imagem extraída do artigo fonte.